terça-feira, 9 de julho de 2013

o cientista

Ele fez os cálculos errados e não acreditou que já esperava que desse errado. Flagrou-se pessimista, sozinho e com frio, forçando a si mesmo a não vestir o casaco: aguente até se acostumar, uma hora as coisas se equilibram. Tanto papel, tanto tempo, tanta insônia. Tantos números. Tantos erros.
Tantos erros.
Ele fez os cálculos errados e não sabia dizer em que linha da conta o raciocínio desandou. Pega os papéis, amassa numa bolinha, joga no lixeiro: cesta. 
Ele queria, inconsolavelmente, tirar a roupa de cientista e voltar a ser só homem, mas nem lembra mais o que fazer lá fora. Queria arrancar a própria pele e sangrar, gritar, sair daquele quarto e deixar os cálculos pra lá. Queria dormir, também. A esperança de que as olheiras fossem sair já estavam findando. Queria ver alguma coisa acontecer - algo que ele tinha deixado passar em seus estudos, algo que ele, gloriosamente, não percebera. Queria ser surpreendido. Queria ter motivos pra dar graças por sua evidente cegueira. Queria estar quebrado e grato, mas raramente conseguia sentir-se grato. Na maior parte das madrugadas, era só quebrado, e estava .
Há uma vela acesa em cima da mesa. É o único lugar onde pode aquecer as mãos e de repente está agarrando-se aquela chama com toda a intensidade de sua vida inteira.
O cientista resolve ficar ali mesmo, cercado de seus livros e pesquisas, mas não quer mais fazer cálculos.
Ele quer ouvir o barulho da chuva e brincar de fogueira com a velinha que luta pra não apagar. 
Ele luta com ela, e eles vencem. 
A recompensa é um sono cansado e sem sonhos que chega com o sol.

Um comentário:

  1. lindo!
    espero que ele (o cientista) não deixe de ler isso.

    orgulho de você. <3

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