Eu tento escalar as camadas nebulosas de minha consciência perturbada para, talvez, chegar lá em cima um dia, acima de qualquer compreensão; e te dar um abraço.
Mas Deus, eu esbarro com seu nome agora em todas as esquinas. E em cada voz que eu ouço pronunciá-lo, você parece diferente, e isso me tirava a paz. Do ápice da minha arrogância, eu, que queria tanto elucidar teus mecanismos, sou consecutivamente frustrada em todas as minhas tentativas de te agarrar. Você me escapa. Nesse mundo onde homens absolutamente ruins produzem coisas absolutamente belas e onde até a matéria morta como as pedras ou a areia é dotada de uma beleza fora do comum. Onde o silêncio e o barulho da multidão podem ser, ambos, bons Caminhos. E sei que tão Santo Espírito não pode estar guiando vidas cujo coração está cheio de maldade e rebeldia mas penso nos nossos muitos infernos e sei que é lá onde a graça é mais bonita. E não entendo. Não entendo nada.
Esses dias eu me flagrei correndo atrás de uma abstração que pudesse me salvar, de um conhecimento, uma ideia específica escondida na tela frágil da realidade que estava óbvia mas justamente por ser tão evidente eu não conseguia captar. E eu não conseguia tocar nisso. Eu não conseguia e não consigo tocar em você. E sou tomada por momentos de sofrimento indizível, e por instantes de beleza absolutos, e tento extrair de tudo isso alguma verdade que eu ainda não saiba, mas no fim dos dias, estou surpresa com todas as complexidades da existência, cansada de tentar equacioná-la, aceitando os cinzas entre o preto e o branco; estou surpresa diante de uma vida que não me dá respostas compreensíveis, mas posso parar aqui: posso parar no estado de surpresa, ou, em outros termos, adoração. E aí, me sinto mal por estar tão leve, por estar desejando ser tão menos do que sempre pensei que precisava ser.
É claro que minha alma ainda está deformada, e tudo o que conheço está misturado com morte, e acontecem o tempo todo uma série de coisas que eu não consigo encaixar com sua presença. É claro que dentro de mim, nas sombras que habitam todas as minhas partes, ainda existe um cheiro de morte. É claro que um lado meu ainda se agarra às respostas certas como meu único e suficiente salvador, mas eu desejo não mais precisar de outro lugar seguro além daqueles três dias há dois mil anos atrás. Enquanto eu acho que preciso subir até o lugar onde você está exaltado, sou levada a crer que um corpo ressurreto é mais ou menos como descobrir que não preciso subir tão alto porque você não está tão longe quanto declaram minhas vãs filosofias.
E olho pra os corpos ao redor de mim. Eles são negros, brancos, amarelos e pardos. Eles são altos, baixos, gordos, magros, eles sorriem e choram, eles moram na cidade e no campo, compram smartphones, carros, livros e comida orgânica; eles se abraçam e se machucam e são pó e são carne e osso e estão bem aqui embaixo, no nível mais rasteiro disso tudo, e não vou encontrar você nas ideias que insistem em não se relacionar com nenhum deles.