segunda-feira, 5 de junho de 2017

tchau, vovó.

vovó era muito mais uma ausência do que uma presença pra mim. eu lembro do meu avô - lembro do timbre da sua voz, grossa, grave, alta, ecoando pelas casinhas onde o vi morar. vovô era uma presença impossível de ignorar. de vovó, só lembro que era uma voz gentil. olhos gentis, sorriso gentil, vovó era só doçura.
acho que chorei hoje porque aprendi a amar vovó pelas histórias que ouvi, pelas fotos, por tudo que meu pai me ensinou e me disse que aprendeu com ela, e o quanto ele a amava! falava dela o tempo todo. eu a amei por causa da família que ela gerou e educou, como se eu amasse resquícios dela, pedacinhos dela espalhados por aí. quando eu ia vê-la, segurava sua mão - era uma mãozinha de papel; eu não sei outra forma de descrever - e imaginava o que estaria pensando aquela mulher gigantesca presa num corpo doente. como se eu estivesse entrando no quarto de uma estranha. pelo que sei dos outros ela também não queria que fôssemos estranhas. mas era tarde demais pra mim, e pra ela, pra que eu ouvisse dela. ela havia parado de falar há muitos anos. eu lembro muito bem da voz do meu avô. da minha avó, não.
todo mundo sabia que a morte de vovó era a libertação de vovó. mas não é como se toda liberdade fosse uma festa. às vezes é só uma urgência, um desespero, um aperto, e o alívio foi amargo.
recebi a notícia. pensei sobre ela, digitei mensagem no celular. mas eu só chorei quando pronunciei em voz alta, "minha avó morreu". foi uma saudade muito grande de tudo que poderia-ter-sido-e-não-foi, mais do que eu consegui segurar pra mim. e é difícil falar sobre isso. convencer os outros que estão bem. nós nem éramos tão próximas, eu disse.
vocês não estão entendendo porque eu estou chorando.

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